ARTIGO: Nas patentes o Brasil avança sem decolar

 O escritório americano de patentes (USPTO, sigla em inglês) divulgou dados das patentes outorgadas em 2012 para cerca de 100 países, com importan tes confirmações no desempenho de alguns emergentes e significativas alterações no ordenamento dos patenteadores.

A relevância desses dados decorre de que a estatística de patentes é a única métrica possível para as inovações tecnológicas, pois ainda que as patentes não englobem todas as variedades de inovação tecnológica, não há nenhuma dúvida de que a correlação entre ambas é estreita, direta e positiva.

Isso significa que quando as inovações se ampliam em uma economia as patentes crescem e, reciprocamente, o aumento das patentes é sempre um indicador de uma ativação maior das inovações e uma maior competitividade da economia. Veremos que é isso que os dados de 2012 indicam.

A inovação não é, necessariamente, uma descoberta ou uma invenção radical. Estas representam menos de 1% das patentes e muito menos das inovações. Mas a agregação continuada dessas inovações comuns é a base do crescimento dos emergentes dinâmicos, tais como China, Índia , Coreia etc.

Como não há patente inter nacional, a forma de comparação possível é no maior mercado: os Estados Unidos. Foram 253.155 patentes concedidas, das quais 121.026 para os americanos, ou seja, a outorga cresceu 12,8% no último ano e 60% neste século, números muito superiores às taxas do PIB, reiterando a crescente essencialidade da inovação como instrumento da competitividade.

Essa taxa média de crescimento da outorga de patentes guarda uma relação empírica de cerca de três vezes à do crescimento do PIB, o que se justifica, pois essa é também a proporção entre as patentes efetivamente utilizadas e o seu total. As demais patentes são em boa parte defensivas.

Os dados deste século mostram que os EUA, a partir de 2008, representam pouco menos da metade das patentes de todos os países no seu escritório, ou seja, crescem menos do que o resto do mundo. Entre os outros países, o Japão ocupa com folga a segunda posição com 50.677 patentes.

No terceiro lugar, a tradicional Alemanha (13.835) deverá ser batida, no ano que vem, p ela ascendente Coreia do Sul (13.233), e em alguns anos por Taiwan (10.646). Do sexto ao oitavo temos Canadá, França e Inglaterra, com menos de 6 mil, e em nono, já com 5.172, está um ator recente: China (incluindo Hong Kong), crescendo à média de 26,8% ao ano desde 2000, ou seja, mais de 17 vezes no período.

Há ainda que destacar a Índia que, com 1.691 patentes, teve um crescimento com média anual de 23,8% neste século, acumulando 13 vezes. E essas patentes estão focadas em software, farmaquímicos e medicamentos, produtos de elevado valor agregado, dando à Índia, mesmo com uma infraestrutura muito deficiente, um excepcional crescimento, ainda que em período de crise mundial, e uma forte mudança em sua distribuição de renda, historicamente muito desigual.

Há um outro país que é uma grande surpresa. A Arábia Saudita, um exportador da commodity petróleo, tinha tipicamente 20 patentes por ano até 2007. Em cinco anos estas aumentaram para 170, 8,5 vezes mais, acima de 20% e m média a cada ano desde 2000. E que patentes são essas? Petróleo e petroquímica, essencialmente, consequência da decisão política de considerar estratégico o domínio de tecnologia própria. Dados do Banco Mundial mostram que o investimento em Pesquisa & Desenvolvimento de inovações, em 2009, foi 0,08% do PIB, US$ 300 milhões, cerca de 20% do nosso Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FNDCT daquele ano. Essa estratégia também não nos seria apropriada, diante da proximidade da produção do pré-sal? Finalmente o Brasil, 28º lugar, com 196 patentes e uma taxa de crescimento anual de 5,9%, ou 2 vezes mais neste século, muito aquém dos emergentes dinâmicos. Essa taxa não assegura um avanço da nossa indústria de mais de 2% ao ano. Os números são eloquentes em si e mostram que a falta de competitividade dos nossos produtos industriais com médio ou alto conteúdo tecnológico tem raízes intrínsecas na baixa agregação de inovações a produtos e processos, além das externalidades j á conhecidas.

Há, porém, um seto r que merece um destaque, pois vem apresentando uma taxa de crescimento duas vezes maior do que a do Brasil como um todo. É o segmento de drogas (medicamentos e seus princípios ativos), fruto de uma política de encomendas à produção de medicamentos no país que vem sendo aplicada continuadamente desde 2008.

É também um exemplo da rapidez da resposta a estímulos que caracteriza a prática de inovações no seu verdadeiro conceito, ou seja, a permanente agregação de melhorias a produtos e processos na produção de uma economia, sem necessariamente representar descobertas impactantes. É esse o grande “segredo“ do sucesso dos países emergentes dinâmicos.

Assim, a nossa posição no grupo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) é consequentemente a última, dada a opção pela exportação de commodities e incentivo ao consumo interno. Estamos próximas à Rússia, outro exportador de commodities, mas cada vez mais distantes das posições de Índia e China, cuja estratégia de cresci mento está focada na contin uada agregação de inovações tecnológicas, mesmo não sendo descobertas nem mesmo invenções radicais.

Embora tenhamos avançado nos últimos anos, há que acelerar muito a nossa incorporação de inovações tecnológicas (não precisam ser descobertas nem invenções radicais) para podermos competir em manufaturas. Na América Latina, à exceção do Chile, estão todos em situação pior, embora isso não nos deva servir de consolo. Precisamos ter a coragem de avaliar os resultados das políticas públicas de incentivo para o aperfeiçoamento da sua aplicação.

Roberto Nicolsky, físico, é pró-reitor de extensão do Centro Universitário Estadual da Zona Oeste (Uezo- RJ) e diretor geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec).

Fonte: Valor Econômico
Autor: Roberto Nicolsky