Estudo revela riqueza microbiana de índios

 Todo ser humano carrega um zoológico de micro-organismos (entre 300 e 1.000 espécies diferentes de bactéria vivem no intestino, por exemplo), mas os índios ianomâmis de uma aldeia isolada da Venezuela ba tem todos os recordes nesse quesito.

O “ecossistema“ de micróbios em seus corpos é o mais variado do planeta, quase duas vezes mais rico em espécies do que o de um morador dos EUA, por exemplo.

Na verdade, a diversidade microbiana (ou “microbioma“, para encurtar) desses ianomâmis supera até a de outros povos nativos da Amazônia e da África, talvez porque as amostras --de fezes, da pele e da mucosa da boca-- tenham sido obtidas logo após o primeiro contato da aldeia com os pesquisadores.

“A aldeia foi localizada por meios aéreos em 2008, e pesquisadores venezuelanos colheram as amostras em 2009. Os moradores diziam nunca ter visto pessoas não pertencentes à etnia ianomâmi e só falavam sua língua original“, contou a médica Maria Gloria Dominguez-Bello, da Universidade de Nova York, que coordenou o estudo.

Devido a esse grau de isolamento, outro resultado do estudo, publicado no periódico especializado “Science Advances“, também surpreendeu os especialistas: as bactérias no organismo dos indígenas carregam uma grande variedade de genes capazes de conferir resistência a antibióticos, embora essa população jamais tenha tido contato com tais remédios.

Para sorte deles, porém, tais genes estão “espalhados“ --é raro haver mais de um na mesma bactéria. Só o uso constante de antibióticos poderia estimular a seleção e a multiplicação de bactérias resi stentes a medicamentos.

Curiosamente, a diversidade do microbioma dos ianomâmis só é similar à dos moradores de países industrializados quando se analisam os micróbios da boca.

Segundo os pesquisadores, isso pode estar ligado ao fato de que eles mascam tabaco com frequência, o que elimina boa parte dos micro-organismos bucais.

MICROBIOMA \'DO BEM\'

A grande variedade de bactérias no organismo dos indígenas não é mera curiosidade. Apesar de ser uma área relativamente recente de pesquisa, já há indícios intrigantes de que um microbioma diversificado é sinônimo de um corpo saudável.

A presença ou ausência de certas populações de micróbios pode estar relacionada a doenças autoimunes (nas quais o organismo se volta contra si mesmo) e à magreza ou à obesidade.

Além disso, tudo indica que o estilo de vida ocidentalizado excesso de higiene e dieta industrializada e pouco variada, por exemplo é capaz de empobrecer o microbioma humano e favorecer certos problemas de saúde.

Segundo essa visão, pessoas não seriam obesas apenas por comerem demais, mas também porque carregam as bactérias erradas.

No caso do microbioma dos ianomâmis, algumas bactérias que quase não aparecem nas demais populações do mundo são capazes de diminuir os riscos de pedras nos rins, afirma José Clemente, da Escola de Medicina Icahn, em Nova York.

“Isso sugere que, conforme as populações tradicionais se adaptam a práticas ocidentais, elas acabam perdendo muitos dos benefícios ligados a abrigar uma rica diversidade de bactérias“, diz.

REINALDO JOSÉ LOPES COLABORAÇÃO PARA A FOLHA