Nenhuma relação entre tríplice viral e autismo

 Em um novo estudo com mais de 95 mil crianças que têm irmãos mais velhos, a aplicação da vacina contra sarampo, caxumba e rubéola (MMR ou tríplice viral) não foi associada ao risco aumentado de transtornos do espectro autista (TEA). O resultado se manteve mesmo em crianças com irmãos mais velhos autistas, ou seja: a relação não foi observada nas crianças em maior risco de desenvolver o transtorno, de acordo com um estudo publicado ontem na “Journal of the American Medical Association” ( JAMA).

Apesar de uma quantidade significativa de pesquisas realizadas ao longo dos últimos 15 anos não ter encontrado qualquer relação entre a vacina MMR e o autismo, pesquisas com pais que têm filhos com TEA sugerem que muitos acreditam que a imunização foi uma das causas contribuintes. Essa crença, combinada com a informação de que os irmãos mais novos de indivíduos com a condição têm maior risco gen ético, muitas vezes faz com que responsáveis evitem a vacinação de seus filhos mais jovens, segundo este estudo.

— Nos países europeus, há uma forte cultura antivacinação, baseada em argumentos sem a menor fundamentação científica — afirmou a presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Isabela Ballalai. — O tão citado estudo que relacionava a tríplice viral ao autismo foi desmentido por dezenas de pesquisas. Posteriormente, descobriu-se que o autor havia recebido pagamento de escritórios de advocacia para conduzir o trabalho. Ele, então, sofreu processo criminal, teve o registro médico cassado e o artigo retirado dos arquivos da revista “Lancet”, em que foi originalmente publicado — lembra.

Como mais uma prova contra o mito dessa associação, a doutora em medicina Anjali Jain, da empresa de consultoria de saúde Grupo Lewin, na Virgínia, Estados Unidos, examinou a ocorrência do transtorno em uma grande amostra de crianças americanas que têm irmãos mais velhos — com e sem TEA. Os pesquisadores usaram um banco de dados administrativo de um grande plano de saúde, com crianças inscritas desde o nascimento até, pelo menos, 5 anos (de 2001 a 2012), que também tinham um irmão mais velho inscrito há pelo menos 6 meses (entre 1997 e 2012).

Das 95.727 crianças incluídas no estudo, 1.929 (2,01%) tinham um irmão mais velho com TEA. No geral, 994 (1,04%) crianças tiveram a condição diagnosticada durante o acompanhamento. Entre as que tinham um irmão mais velho autista, 134 (6,9%) também foram diagnosticadas — em comparação com 860 (0,9%) que tiveram diagnóstico do transtorno mas não tinham irmão autista. A taxa de vacinação de MMR (uma dose ou mais) para as crianças com irmãos sem TEA foi de 84% (78.564) aos 2 anos e 92% (86.063) aos 5 anos. Em contraste, as taxas de vacinação de MMR para crianças com irmãos mais velhos com TEA foram menores (73% na idade de 2 anos e 86% aos 5 anos). A análise dos dados indicou que a vacina MMR não estava associada ao risco aumentado de TEA em qualquer idade.

“Não encontramos nenhuma evidência de que o recebimento de uma ou duas doses de vacina MMR tenha sido associado ao risco aumentado da condição entre as crianças que tinham irmãos mais velhos com TEA. Enquanto a prevalência do diagnóstico de TEA aumenta, o mesmo acontece com o número de crianças que têm irmãos com diagnóstico de TEA, um grupo de crianças particularmente importantes, pois foram menos vacinadas em nossas observações, bem como em relatórios anteriores”, escrevem os autores.

TREINAMENTO DOS PAIS REDUZ SINAIS

Um outro estudo, também publicado ontem na “JAMA”, patrocinado pelo Instituto Nacional de Saúde Mental (NIMH, na sigla em inglês) com seis universidades, entre elas a de Indiana, Ohio e de Yale, nos Estados Unidos, mostrou que crianças de 3 a 7 anos, com autismo e graves problemas de comportamento, melhoraram depois que seus pais foram treinados durante semanas para lidar com reações agressivas e de isolamento — e os benefícios foram observados por até seis meses após a intervenção.

O treinamento forneceu aos pais estratégias específicas sobre como lidar com acessos de raiva, agressão, autolesão e abandono. Um outro grupo de pais usado na comparação feita pelo estudo apenas recebeu informações sobre a doença.

Após 24 semanas, as crianças “do grupo de treinamento” mostraram melhora de 48% em relação ao comportamento separatório, comparado a um declínio de 32% para “o grupo de educação”. Na última semana, 70% das crianças “do grupo de treinamento” mostraram resposta positiva em comparação com 40% “para o grupo de educação”.

Fonte: O Globo
Autor: ANTONELLA ZUGLIANI