Mulheres ainda relutam em consultar médico

Jornal do Comércio - RS

De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), era estimada para o ano passado a ocorrência de 18.430 casos de câncer do colo do útero no Brasil, correspondendo a 51 novos casos da doença por dia. Ainda segundo o Inca, 50% das mulheres morrem quando a enfermidade se encontra na fase mais avançada. Em relação ao câncer de mama, a estimativa apontava 49.240 casos em 2010, ou 135 novos casos diários. A doença na mama é o tipo de câncer mais comum em mulheres. O Rio Grande do Sul é o segundo estado com a maior incidência de câncer de mama do País, com a estimativa de 81,57 casos por 100 mil pessoas, ficando atrás do Rio de Janeiro (88,30 casos por 100 mil). O índice de mortalidade da doença no Rio Grande do Sul é de 15,54 por 100 mil.

Diante da seriedade do tema, a Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Rio Grande do Sul (Sogirgs) alerta para a importância da realização do exame anual de revisão por parte das mulheres. Conforme a ginecologista e diretora da associação, Maria Celeste Wender, ainda existe resistência por parte das mulheres em realizar as consultas e exames ginecológicos.

“Temos um grupo de resistentes, que não gostam de ir ao médico, não gostam de fazer exames, que não se preocupam muito com a própria saúde. Às vezes, atendemos a mulheres na casa dos 60 anos de idade que nos dizem que a última vez que foram ao ginecologista foi quando nasceu o último filho, há mais de 20 anos“, afirma.

O câncer do colo do útero é o segundo tipo de câncer mais frequente entre as mulheres, com aproximadamente 500 mil casos novos por ano no mundo, sendo responsável pelo óbito anual de, aproximadamente, 230 mil mulheres. Com exceção do câncer de pele, é o câncer que apresenta maior potencial de prevenção e cura quando diagnosticado precocemente. “O câncer do colo, infelizmente, ainda é bem prevalente aqui. Em países desenvolvidos quase não existe mais. Aqui ainda temos mortes por isso, muito por as mulheres não seguirem essa recomendação“, observa Maria Celeste.

De acordo com a especialista, a estrutura do sistema público de saúde para o atendimento às mulheres dá conta da demanda atual em razão da pouca procura pelo atendimento médico. “Se fôssemos observar a necessidade, seria deficiente. Não é porque a maioria das mulheres acaba não procurando. Aqui até temos uma cobertura com uma qualidade boa, se formos comparar com outros estados. A deficiência é mais da ausência do profissional de saúde. Principalmente no Interior, em cidades menores“, diz.

Uma das razões da baixa procura feminina pela consulta anual de prevenção pode estar relacionada à dificuldade da ocorrência do estreitamento dos vínculos entre o médico e a paciente para quem recebe atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). “A falta da criação do vínculo é uma falha do SUS. Precisa ser solucionada, mas é difícil no nosso modelo“, observa a diretora da Sogirgs.

Recentemente, o Inca lançou as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero. A principal novidade das novas diretrizes é a ampliação da faixa etária para a qual é recomendada a realização de exames preventivos periódicos. Agora mulheres até 64 anos deverão ser examinadas. “Essa mudança representa o posicionamento do órgão máximo do controle do câncer no País. É o que há de mais moderno sobre a doença. Em um programa nacional de combate ao câncer é importante que a cobertura seja ampla“, afirma o presidente do Instituto de Prevenção do Câncer de Colo do Útero (Incolo), Paulo Naud.
Conforme Naud, o sistema público de saúde possui estrutura suficiente para realizar o atendimento à população.

“O que falta é um ajuste na eficiência dos setores que realizam esse atendimento. Aqui no Estado, temos uma estrutura comparada até com alguns países da Europa. A estrutura é boa, mas é preciso aperfeiçoar algumas coisas“, ressalta.

Para o ginecologista, falta informação para as mulheres sobre a partir de qual faixa etária devem começar a fazer o exame de revisão e com qual frequência ele tem de ser realizado. “Há mulheres que fazem dois, três exames por ano e outras que ficam mais de cinco anos sem procurar um médico“, diz.

Para realizar a consulta de revisão, as mulheres devem procurar um posto de saúde ou o seu ginecologista pessoal. Se o posto de saúde não possui médico especialista, a paciente será encaminhada para um outro centro médico. Segundo Maria Celeste, dois são os marcos que indicam a necessidade da procura do médico. “A partir do primeiro período menstrual e do início da vida sexual. Esses dois são marcos importantes. A primeira consulta deve ser feita quando a menina começa a menstruar. A revisão anual, em geral, se faz necessária a partir do início da vida sexual“, destaca.

De acordo com Naud, o câncer do colo do útero geralmente tem origem na presença do papilomavírus humano (HPV). “Ele tem um desenvolvimento lento e sem sintomas e é o único câncer ginecológico que pode ser 100% controlado e até eliminado da sociedade. Ele poderia desaparecer se a prevenção fosse feita“, diz.
As duas principais formas de prevenção da doença se dão através do exame conhecido como papanicolau e de vacina.

A vacina contra o HPV ainda não consta no calendário nacional de imunização. Uma das razões disso, de acordo com o presidente do Incolo, é o custo das imunizações. “Uma cirurgia de câncer de colo hoje pelo SUS custa em torno de R$ 6 mil. As três doses da vacina não custam mais de R$ 1 mil na rede privada.
No sistema público esse valor cairia muito devido à quantidade comprada“, afirma. Naud se diz confiante em relação ao futuro do combate à doença no Brasil. “O governo federal vem fazendo bem mais do que em anos passados. A perspectiva é boa“, enfatiza.